A
participação das igrejas nas campanhas eleitorais tem se mostrado cada dia mais
crescente na realidade brasileira. Esse fenômeno tomou tanta proporção, que é
possível dizer que o posicionamento político de alguns líderes Evangélicos e/ou
Católicos pode mudar o rumo de uma corrida presidencial. No entanto, até onde é
saudável a igreja se envolver com a política?
Não
há nenhuma menção nos Evangelhos de militância política por parte de Jesus. Ele
nunca buscou Pilatos, Herodes, ou César para que os mesmos o ajudassem na
disseminação do Evangelho. Também não encontramos nenhuma indicação de que os
Apóstolos ou discípulos tenham feito o mesmo.
O
que Jesus fala sobre política é que devemos dar a César o que é de César, e a
Deus o que é de Deus. Essa afirmação mostra claramente que Jesus defendia que
as duas coisas deviam andar separadas.
A
recomendação dos Apóstolos é que a postura do discípulo deve ser de orar pelas
autoridades, para que se possa viver vida tranquila e mansa, sem as
perseguições que eram comuns àquela época (cf. 1 Timóteo 2.1-2). Parece-me que
a grande preocupação dos Apóstolos era simplesmente orar para que os governos
comumente tirânicos daquela época os deixassem em paz para viver e pregar o
Evangelho. Mas, nem mesmo essa preocupação era transformada em pauta política,
pois não se sabe de nenhuma “manifestação dos cristãos primitivos pela
liberdade de pregação”. A recomendação apostólica era de simplesmente, em
silêncio, orar pelos governantes.
É
preciso lembrar que foi a política – emulada pela religião – que matou Jesus e,
posteriormente, muitos dos seus discípulos. Nos meus textos eu combato
veementemente a potestade da religião, que foi a principal responsável pela perseguição
e morte de Jesus e dos discípulos, mas não podemos esquecer que a religião não
teria conseguido fazer o que fez se não tivesse tido o apoio da política. A
religião e a política por si só já podem ser monstros extremamente
danosos às pessoas. No entanto, quando a política e a religião se unem, cria-se
um monstro degeneradamente perverso que sempre finda perseguindo o verdadeiro
Evangelho e seus representantes. Foi exatamente quando a religião se misturou
com política que tivemos as maiores calamidades da história da humanidade.
Porém,
a igreja não entende o mal dessa mistura, e quer a qualquer custo enfiar goela
abaixo a sua pauta através da política. Não estou dizendo que os cristãos não
devam ter uma posição sobre os assuntos da vida. O problema é transformar essa
posição numa militância política. Jesus, por exemplo, tinha posições sobre
todas as coisas, mas nunca militou politicamente por elas.
Isso
ocorre porque se ele buscasse apoio político para que as pessoas seguissem seus
ensinos, não haveria sinceridade em seus seguidores, mas apenas uma observância
mecânica à lei. Jesus quer ser seguido por liberdade de consciência em fé, e
não por uma imposição política à sociedade.
Imagine
se todos fossem heterossexuais porque existe uma “lei cristã” que proíba as
pessoas de expressarem sua homossexualidade? Isso não faz sentido! Deus não
quer obediência forçada. Caso contrário, seria melhor que Deus tivesse criado
todos nós como meros robôs, sem capacidade de decisão. Porém, ele dá liberdade
a todos para seguirem ou não seu ensino justamente para que cada um seja
cobrado pelo modo com que fez uso de sua liberdade.
Portanto,
não transforme sua fé numa militância, não crie uma “Ditadura Cristã” sobre a
vida alheia! Até porque, isso não traz resultado algum que não seja repulsa.
Para toda ação existe uma reação. Quanto mais os cristãos tentam fazer descer
por goela abaixo seus princípios, mais repulsa da sociedade eles colhem.
E
mais, toda essa militância política tem feito mal aos pregadores do Evangelho,
sejam eles de Direita ou de Esquerda. Quando um pastor começa a militar na
política por um lado, ele fecha a porta para a pregação do Evangelho aos que
estão do outro lado do espectro político, pois os mesmos não vão querer ouvi-lo.
Isso só faz mal à propagação do Evangelho e às vidas que poderiam ser
beneficiadas com a mensagem.
É
bem verdade que naquela época nem Jesus nem os Apóstolos viviam numa
democracia. Talvez isso explique sua pouca participação na política, pois
realmente era inviável lutar por algo em um governo totalitário. Mas, será que
se Jesus estivesse em nosso meio, vivendo nossa democracia, ele se engajaria na
causa dum partido, seja ele qual for? Acho muito difícil! Jesus é Jesus demais
pra isso! Se ele não cabe nem em caixinha teológica, quanto menos caberia em
caixinha de ideologia partidária? Diante dessa incerteza sobre como Jesus
agiria em um contexto democrático, deixo os seguintes conselhos aos que buscam
se envolver com política:
1 – Siga o princípio deixado
por Jesus de separar as coisas. É justamente o “dar a César o que é de César, e
a Deus o que é de Deus”. Isto é, quando luto por política, minha causa é
meramente terrena e social, pois busco a progressão e organização da sociedade
de forma justa e igualitária a todos. Não luto para impor minha fé a ninguém
através da força do Estado. Como disse Paulo, “A fé que tens, tem-na para ti
mesmo perante Deus” (Rm 14.22). Logo, lute por liberdade no que se refere às
decisões pessoais: quem quiser usar drogas, que use, mas quem quiser se abster
em nome da sua fé, que faça; quem quiser ser homossexual, que seja, mas quem
quiser se abster em nome da sua fé, que faça; quem quiser ir a um culto, que
vá, mas quem quiser ser ateu, que seja. É esse tipo de obediência que Deus quer:
movida por pura liberdade de consciência em fé.
2 – Não cause
escândalo. Um amigo meu, cuja fé creio ser sincera, resolveu deixar de apoiar Jair
Bolsonaro só pelo fato de muitas pessoas terem repulsa a figura dele. Achei essa
atitude fantástica. Depois da atitude dele, eu mesmo repensei sobre até onde
devo ir na minha militância política. Chega um momento que o desgaste não vale
a pena. A própria igreja evangélica ainda não percebeu o que perdeu ao apoiar
massivamente um candidato que, pela mensagem de ódio que propaga, é recordista
em rejeição pela sociedade ao ponto de ter sido até esfaqueado. A sociedade nunca
mais verá a igreja evangélica com os mesmos olhos depois dessas eleições. E não
lhes tiro a razão, posto creio ser impossível professar pregar o amor de Deus e
ao mesmo tempo apoiar um candidato que propaga o ódio. Aliás, a instituição
como um todo não deveria apoiar candidato nenhum, pois o objetivo principal da
igreja deve ser espiritual. No entanto, algumas instituições religiosas
acabaram quase que virando partidos políticos.
3 – Aja com “espírito
de moderação”. Devemos ter cuidado para não enfatizar demais as pautas sociais
em detrimento das espirituais. Digo isso porque conheço alguns pastores que
quase viraram cientistas políticos nessas eleições, se esquecendo de pregar o
Evangelho. Portanto, não podemos esquecer nossa prioridade como cristãos que é viver
o Evangelho e pregá-lo aos que quiserem ouvir. Nossa luta não é contra o sangue
e a carne, e sim contra os principados e potestades, contra as forças
espirituais do mal nas regiões celestes.
4 – Não seja fanático
por um político. Nossa adoração e confiança irrestrita devem ser a Deus e
somente a ele. Tenha sempre desconfiança e um pé atrás antes de defender
qualquer político. “Maldito o homem que confia no homem, e faz da carne o seu
braço, e aparta o seu coração do SENHOR!" (Jeremias 17:5). Eu mesmo demorei
muito para aceitar esse ponto nessas eleições. A paixão cega encobre os
defeitos. Apaixonei-me cegamente por Ciro Gomes e sofri um pouco com isso. Ainda
creio que ele é o melhor candidato para o Brasil, mas deixei de lado algumas
práticas de defesa a ele, pois já estavam beirando o fanatismo.
Creio
que esses quatro conselhos são os principais, deles se ramificam qualquer
outro. Ainda é muito difícil traçar uma linha delimitando até onde é correto
militar politicamente. Acredito que de acordo com a sua realidade contextual o
Espírito Santo irá lhe orientar até onde você deve ir nessa luta. Em minha
opinião, se lhe for possível, fuja da militância político-partidária, pois essa
potestade só traz ódio, trapaças, intrigas, dor, corrupção, e tristeza. Mas, se
não pode omitir-se diante das mazelas sociais que estão ao nosso redor, digo-lhe
que ao menos faça da forma mais cristã possível, lembrando sempre que nosso
objetivo maior não é esse.
Nele, que nunca se
apoiou em político nenhum, mas mesmo assim conseguiu mudar o mundo.
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