segunda-feira, 1 de janeiro de 2018

Não seja um crente chato

Toda distorção do entendimento que uma pessoa tenha do evangelho leva à uma fé adoecida. Quanto maior a distorção, maior o adoecimento. No começo da minha vida cristã, quando eu tinha 18 anos, eu achava que defender assuntos morais era o método correto de pregação do Evangelho. Discursava sobre a imoralidade da sociedade e a relativização da mesma para com os usos e costumes cristãos, criticava o crescimento do uso de tatuagens, falava para as pessoas quais eram as roupas decentes que elas deveriam vestir, o corte de cabelo que deviam ter, criticava as farras constantes dos meus amigos do futebol; enfim, não sei como as pessoas me aguentavam.

Não demorou muito e eu percebi que não era assim que Jesus agia. A pauta da pregação de Jesus não foi assuntos superficiais como usos e costumes. O foco da mensagem dele era simplesmente a graça, a misericórdia, e o amor do Pai, estendendo a mão e oferecendo graciosamente salvação a todos.

No sermão do monte Ele dá ensinos práticos sobre a melhor forma de viver a vida na Terra: fala sobre humildade de espírito, sobre a importância da mansidão, sobre ser misericordioso e pacificador, etc. Nas parábolas, o vemos falando do mistério do Reino dos Céus e da graça oferecida àqueles que quiserem aceitar entrar.

As únicas vezes em que ele agia especificamente no pecado de alguém era quando alguém o procurava e pedia ajuda. Jesus não saía, por exemplo, de porta em porta procurando por prostitutas para criticá-las. Agir assim apenas faria dele um “crente chato” como eu era e afastaria as pessoas dele. Muito pelo contrário, Ele se dava muito bem com as meretrizes, roubadores, publicanos, e pecadores em geral. Conforme eles conviviam com Jesus, iam mudando de forma natural, sem nenhuma imposição. E os que não queriam mudar, Jesus deixava a vontade para continuar na companhia dele ou não; o jovem rico preferiu ir embora, já Judas ficou até o fim – e nem por isso Jesus rejeitou sua companhia ou o tratou com menos amor que os outros.

O problema é que alguns cristãos acham que foram ungidos por Deus como fiscais da vida alheia. Isso acontece porque normalmente não entendem o que é ser sal e luz na Terra, e pensam que ser isso é fazer descer por goela abaixo da sociedade aquilo que eles entendem ser a moral cristã, família tradicional, ou costumes judaico-cristãos.

A sociedade não tem obrigação de seguir esses ditames! Aliás, “obrigação” não combina com seguir Jesus. Ele quer ser seguido por liberdade de consciência em fé, nunca por obrigação. Essa militância dos evangélicos em apoiar e ecoar discursos extremistas e moralistas só tem catalisado ódio e mais ódio para o meio evangélico. Parece que eles entenderam errado o “ide”, pois fazem parecer que entenderam assim: “ide por todo mundo e envergonhai meu nome diante de toda criatura”.

Semana passada viralizou um vídeo da Sarah Sheeva alfinetando a cantora Anitta, afirmando que não é certo ser malandra, e sim princesa. A pastora Sarah roda o Brasil e o mundo com palestras intituladas “seja princesa de Deus e não cachorra”. Gente, por favor, né? Isso é pregar o Evangelho? Jesus nunca agiu assim! Chega a dar vergonha alheia. Como diz em Romanos 2.24: “o nome de Deus é blasfemado entre os gentios por vossa causa”.

Depois de o vídeo dela virar chacota nacional, provavelmente ela foi dar testemunho do quão ela é perseguida por “pregar o evangelho”. Mal sabe ela que isso nunca foi pregação do evangelho.

Quem quer ser malandra, que seja; quem quer ser princesa, que seja; Jesus recebe tanto uma como a outra, para ele não há distinção. Se a malandra tiver sofrendo por ser malandra, ele oferece a mão para ajudá-la se ela quiser ser ajudada; da mesma forma ele ajuda a princesa nas suas fraquezas e debilidades.

Essa praxis de dividir as pessoas em grupos acaba passando a ideia de que Deus só aceita as pessoas do grupo moralmente perfeito, e isso não é verdade!

Jesus sempre recebeu a todos, desde os perfeitinhos até os mais estigmatizados. Os que Jesus teve mais dificuldade em tratar foram justamente os que defendiam a pauta do moralismo religioso. Sim, eles mesmos, os fariseus! Poucos foram os fariseus que conseguiram ter um encontro profundo com Jesus. Para Jesus era mais fácil tratar e andar com os pecadores do que com os xerifes da religião.

Se você leu até aqui, deve ter entendido o que é ser um cristão chato. No entanto, como que se pode ser sal e luz sem ser chato? Simplesmente sendo como Jesus! Vou listar algumas coisas que aprendi com Jesus:

Transforme água em vinho e participe da festa. Não seja o esquisitão que depois que se converteu deixou de andar com seus amigos antigos. Jesus NÃO veio para te tirar do mundo e te colocar numa bolha (cf. João 17.15).

Pare de criticar as pessoas. Entenda que aos olhos de Deus tua moralidade cristã não te faz menos pecador do que qualquer outro que esteja aquém do nível de moralidade proposto pela igreja.

Seja um amigo normal. Não se aproxime das pessoas com a ideia fanática de fazer proselitismo religioso. Se tiver a oportunidade, fale de Jesus e não de religião. Ficar defendendo placa de igreja é um saco!

Quando disse no parágrafo anterior o “se tiver oportunidade” é só se tiver oportunidade mesmo! Não fique pentelhando as pessoas para ouvirem a sua pregação. Te garanto que na realidade do nosso país qualquer um já ouviu pregações mil vezes melhores que a sua. Pregue com atitudes de amor conforme Jesus, isso está faltando no Brasil. Ao fazer isso, você verá que as pessoas se aproximarão de você e abrirão o coração sobre seus dilemas espirituais naturalmente.

No caso de reuniões, cultos, ou eventos, convide de vez em quando. Em eventos assim a pessoa vai se quiser, logo não há intromissão da sua parte. Só evite cobranças contínuas. Bom senso é tudo.

Assim, sem fanatismo e sem paranoia religiosa, você ajudará a muito mais pessoas se chegarem verdadeiramente a Jesus; se não, simplesmente fará grandes amigos. 

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