É extremamente difícil
de conciliar a doutrina da predestinação com a da liberdade humana. Afinal,
aparentemente uma ideia se contrapõe a outra. Ora, como que pode haver algo
predestinado se a liberdade humana pode “bagunçar” o plano que outrora fora traçado?
É por isso que
geralmente os teólogos militam nos extremos das duas ideologias; ou se acredita
numa predestinação total, em que nós somos meros robôs cumprindo o calendário
estabelecido pela divindade; ou se acredita que Deus apenas ativou o universo e
saiu de cena, deixando a humanidade entregue às consequências das próprias
decisões.
O problema desses dois pensamentos é que eles pensam que a ação de Deus está restrita ao passado, presente e futuro. No entanto, para entendermos esse tema precisamos entender que Deus não está restrito a essas esferas.
Acima temos um gráfico
do espaço-tempo que mostra toda a criação de Deus durante todas as épocas. A
parte preta do gráfico nos remete ao Nada (com letra maiúscula). No entanto, é
impossível imaginarmos o Nada, por isso está representado pela cor preta. Quando
tentamos imaginar o Nada, geralmente pensamos no vácuo, mas até mesmo o vácuo é
alguma coisa, pois faz parte da criação e está inserido dentro do gráfico do
espaço-tempo, assim como a cor preta também está. É impossível imaginarmos o
Nada porque ele está para fora das paredes da criação, por isso tentamos
representá-lo de alguma forma.
É esse o nível de
complexidade que temos que admitir ao tentar entender o agir de Deus. Assim
como o “Nada” do gráfico, Deus também não foi criado – Ele foi quem criou todas
as coisas – e, por não ter sido criado, não está inserido no gráfico do
espaço-tempo da criação. Assim, Ele não está restrito, como nós, ao passado,
presente e futuro. É como se o tempo, para Ele, acontecesse de forma simultânea.
Mesmo nesse nível de
complexidade, tentarei expressar o que penso a esse respeito, mas, como dito
anteriormente, quase tudo não passará de mera conjectura, posto o assunto estar
fora do nosso alcance intelectual.
Assim, por saber que Deus
não se encaixa nas noções de tempo humanas, por serem restritas a linearidade,
eu não acredito de forma alguma no extremismo calvinista que prega que tudo
está fatalmente determinado linearmente, como se fôssemos robôs. Creio que há
uma relação entre a soberania de Deus e a liberdade humana.
Acredito que para cada
decisão que tomamos, caímos em um universo paralelo diferente. É como se
existissem milhares de linhas temporais possíveis, mas nossa decisão pessoal
nos leva a cada uma delas. Segue abaixo um desenho simplificado dessa ideia:
É agora que entra a
chave para entendermos todo o processo. Para alguns, Deus fez uma determinação
no passado que não pode ser alterada pelas nossas escolhas, pois se
alterássemos faríamos Deus errar, e isso não pode acontecer.
No entanto, ao pensar
nisso é preciso inserir na equação a variável que falei anteriormente: Deus não
está restrito ao tempo, por isso não tem como Ele ter feito alguma coisa. Deus faz,
Ele é. O que quero dizer é que a
predeterminação dele não está presa no passado, posto que para ele tudo
(passado, presente e futuro) é simultâneo. Ou seja, Ele pode traçar uma nova
linha determinística de acordo com as decisões que tomarmos como se Ele
estivesse agora no passado.
No livro de Reis
podemos verificar claramente a atuação de Deus em relação às linhas temporais: “Toma as flechas. Ele as tomou. Então, disse
ao rei de Israel: Atira contra a terra; ele a feriu três vezes e cessou. Então,
o homem de Deus se indignou muito contra ele e disse: Cinco ou seis vezes a
deverias ter ferido; então, feririas os siros até os consumir; porém, agora, só
três vezes ferirás os siros.” (2 Reis 13.18,19). Jeoás, rei de Israel, foi
ao profeta Eliseu para saber se Deus abençoaria a Israel na batalha contra os
siros. Para verificar a fé do rei, o profeta pede que ele realize uma tarefa
aparentemente boba: atirar flechas ao chão. Por não acreditar muito na palavra
de Eliseu, o rei pega as flechas e atira apenas três ao chão. O rei tinha o
direito de escolher atirar quantas flechas quisesse, mas ele escolheu a linha
temporal de atirar apenas três flechas. O próprio Eliseu afirma que se a
escolha tivesse sido cinco ou mais flechas, ele feriria totalmente os siros,
mas o rei não fez assim. Uma linha temporal ia por um caminho, a outra linha
temporal ia por outro. Infelizmente, por falta de fé, ele escolheu o pior.
Assim, nossas escolhas
movem nosso destino. Se não trancarmos a porta da casa, um ladrão poderá
entrar; se podemos pagar um seguro veicular e não fazemos, um dano poderá
ocorrer; se não corrermos atrás de trabalho, passaremos necessidade. Enfim,
devemos agir correta e prudentemente em tudo o que estiver ao nosso alcance,
caso contrário, colheremos as consequências. Só assim o homem pode ser cobrado
pelas suas ações no dia do juízo final.
Em contrapartida, o
universo não está solto somente às nossas escolhas. Existem situações em que
Deus intervém conforme Ele acha que deva intervir. E quais situações são essas,
exatamente? Não sei, Deus é quem sabe! Mas separei alguns textos bíblicos que
mostram a atuação divina sobrepondo-se à decisão humana.
Um dos textos que
mostra claramente a interferência de Deus no livre arbítrio é o seguinte: “Tendo Faraó deixado ir o povo, Deus não o
levou pelo caminho da terra dos filisteus, posto que mais perto, pois disse:
Para que, porventura, o povo não se arrependa, vendo a guerra, e torne ao
Egito.” (Ex. 13.17). Deus, sabendo que o povo tinha liberdade de escolha,
preferiu que Moisés guiasse-os por outro caminho, pois pela presciência divina
Ele sabia que se o povo visse a guerra no território filisteu, teria medo e
voltaria ao Egito. Então, Ele faz Moisés guia-los por um caminho mais distante,
não os deixando cair na linha temporal que os faria escolher voltar ao Egito.
O caso mais usado para
defender a predestinação fatalista é o de Faraó, por conta de uma interpretação
errônea do que Paulo escreveu em Romanos 9: “Porque
a Escritura diz a Faraó: Para isto mesmo te levantei, para mostrar em ti o meu
poder e para que o meu nome seja anunciado por toda a terra.”
Para alguns, Deus criou
Faraó como um robô, programado com um coração endurecido para que resistisse a
ordenação divina e não deixasse sair o povo. Eu não creio assim. Acredito que
Faraó foi uma pessoa comum como eu e você, mas que se deixou corromper pelo
pecado da arrogância. Após ele mesmo se deixar engodar pelo pecado da
arrogância, Deus o “levantou” como governador do Egito, porque sabia que o
coração arrogante dele faria com que resistisse às ordenações divinas. Se outro
homem de coração humilde tivesse subido à posição de Faraó, o propósito de Deus
não se cumpriria. Então, Deus interfere na história e usa meios para que o
homem que Ele quisesse chegasse à posição de governador do Egito.
A narrativa do Êxodo
diz que o coração de Faraó se endureceu ao Moisés fazer a primeira solicitação
do povo sair do Egito. Creio que esse endurecimento também não foi robotizado,
mas Deus usou situações para que isso acabasse acontecendo. A narrativa diz que
nas duas primeiras vezes que Moisés foi falar com ele para que deixasse ir o
povo, os seus feiticeiros conseguiram repetir os milagres feitos por Moisés. Assim,
o fato de os feiticeiros terem conseguido repetir fez com que ele
desacreditasse nos sinais divinos e não deixasse o povo sair. Nos milagres
seguintes os feiticeiros não conseguiram repetir os feitos de Moisés, mas o
orgulhoso Faraó não voltaria atrás na palavra de proibição que havia dado.
Poderia citar várias
histórias, como a mais conhecida, a de Jonas, que mostra a ação de Deus usando
situações para interferir no livre arbítrio humano. Mas, acredito que as
citadas já servem para demonstrar como funciona meu raciocínio. Eu penso que o
livre arbítrio existe, mas de forma mitigada. Podendo Deus intervir como bem
quiser na história da humanidade. Se o bater de asas de uma borboleta pode
causar um tufão do outro lado do mundo, Deus pode muito bem fazer essa mesma
asa parar de bater para que o tufão seja evitado.
Até mesmo os problemas
existentes na humanidade são resultantes de decisões pecaminosas do homem. Se
existiu escravatura, foi porque homens cruéis subjugaram inocentes para
maximizar seu lucro; se existem guerras, é em função da sede por poder político
e financeiro dentro do coração humano; se existe fome na África, é porque o
país foi saqueado pelos colonizadores e mal administrado por anos, chegando à
situação que está hoje. Enfim, Deus não tem culpa dos problemas da humanidade. Ele
deu o governo da Terra ao homem no Éden, e as decisões humanas trazem
consequências sobre nosso planeta. O homem destrói a si mesmo e depois tenta
jogar a culpa em Deus.
Deus nao tem os nossos limites. Nao precisa relogio, calendario, para ele nao ha passado, nem futuro. Tudo isso pertence ao ser humano. Esse assunto eh complicado porque Deus eh alem da nossas compreensao. Muito bem lembrado. (ainda nao li o artigo todo... rsrsrs)
ResponderExcluirÉ verdade, Deus é muito além do nosso alcance intelectual.
ExcluirMuito bom tê-lo aqui acompanhando o Blog. Abraços!